E um dia, Deus, no alto de sua magnificência, desceu apressado pelos degraus do Éden, largando seu livro de cabeceira aberto em cima de uma nuvem qualquer que passava! Lá de cima ele conseguia enxergar o clarão... eram centenas de milhares de explosivos... não só de fogo, mas principalmente de palavras... que se jogavam ao vento em tiro cruzado entre os humanos de sua criação!
O fruto do seu trabalho, julgava o criador, era falho! Largara os humanos no mundo sem manual de instruções e faltava à maioria deles um ingrediente essencial chamado bom senso. Faltava a sensibilidade da percepção quanto aos sentimentos e desejos alheios. Talvez por que a socialização dos seres tiravam-lhes algo que julgaram erroneamente mal, o instinto!
Talvez, se os filhos de Adão e Eva se permitissem sentir seus desejos mais internos, assim cuidassem mais um dos outros. Talvez a animosidade animalesca trouxesse algo de bom e de mais espontâneo a regrar os jogos das relações inter-humanas. Aceitar que os sete pecados capitais vêm de dentro, bem como as dádivas, estas bem mais fáceis de conviver e aceitar.
Deus pôs-se a observar de perto seus filhos, tão perdidos quanto desvirtuados, sem noções de limites ou de respeito ao próximo. Destruindo amores por não saber como lidar sequer consigo mesmos. Construindo a paz aparente sob pilastras frágeis de medo e feridas mal cicatrizadas, valorizando o que não vale nada e ignorando as verdadeiras dádivas divinas.
No segundo de um piscar de olhos, Deus os calou. Cessou a guerra de palavras e fez com que apenas sentissem. Discursou mentalmente acerca da necessidade de perceber o outro além das letrinhas justapostas, falou da importância do sentido além da visão, do olfato, do tato, do paladar e da audição... era aquele sentido que não se vê mas se ouve em silêncio, como se devêssemos (e devemos mesmo) saber o próximo passo a ser dado apenas por dar um pouco mais de atenção a nossa sensibilidade.
Uma sensibilidade que nem Deus conseguirá explicar ou entender, mas que, sabia ele, era crucial ao bem estar terreno. Era essencial à busca pela perfeição criativa, ao reconhecimento do respeito ao próximo e à nós mesmos. Deus sabia que respeitar o sexto sentido (ou instinto, como preferir chamar) era parte importante do processo de autoconhecimento, através do qual, o homem obteria a honra de estar perto de Deus.
Neste dia, em que o Criador reencontrou a Criatura ele explicou e entendeu que apenas conhecendo-se internamente e aceitando o bem e o mal que nos coabitam, poderemos ter controle e ponderar com sensatez nossas atitudes e desejos a serem externados. Ainda, conhecer a nós mesmo é a única forma de conhecer ao próximo. Deus não condenou as palavras, mas deixou claro que se elas não fossem utilizadas com parcimônia, a voz não teria mais a menor importância e que um dia então, falar, seria o mesmo que calar.
Foi então que o homem se calou, parou de pensar com o cérebro e começou a pensar com o coração.
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